domingo, 10 de abril de 2011

A Hora do Coroa

Postado por Acir Antão on domingo, abril 10, 2011 with Faça um comentário
Homenagem que fizemos à Moreira da Silva, textos de Raphael Vidigal




Vou te contar a história de um malandro astuto
Que subiu o morro
E arrumou confusão
Tudo porque bateram na sua nêga
E ele então, foi tirar satisfação

Esse malandro fez muito samba
Depois de cantar com outros bambas
Wilson Batista, Macalé e Miguel Gustavo
Cantou a ópera com Bezerra e Dicró

“Cuidado, Moreira!”

Mas nunca largou o linho branco
E o chapéu panamá na cabeça brasileira
Vou lhe dizer sem sugestão
Qual é o nome desse figurão

Fala: “Derrepenguente as coisas acontecem e nós da Hora do Coroa, estamos aqui pra falar pra vocês: passado, futuro, presente, tudo depende.”

Pode chamar de Moreira da Silva
Alguns o chamam Morengueira velho oeste
É o herói do cinema americano
É o herói da música que segue

Cambaleando com estilo
Vem com pompa e circunstância

Segura a faixa que nosso Moreira
Não bebe, não fuma, não perde a noite de sono
E não há nada que o irrite mais
Que um certo amigo urso não pagar a condição
“malandro que é malandro, não é malandro”
Breque!

Chega de papo “vamo” ouvir seu carteado!
Etelvina!



Arrasta a sandália

Depois de se virar como motorista de táxi e auxiliar de garagem, entre outras profissões, Antônio Moreira da Silva, que perdeu o pai jovem, quando tinha 11 anos de idade, lançou seu primeiro sucesso como cantor, no ano de 1933. “Arrasta a sandália” foi um samba de carnaval de autoria de Aurélio Gomes e Baiaco que esbanjava a condição do protagonista: “arrasta a sandália, minha morena, estraga mesmo e não tenha pena...” “que eu te dou outra de veludo, enfeitada de fita, e mando vir lá da Bahia”.

Implorar

Em 1935, Moreira da Silva venceu o carnaval cantando o samba “Implorar”, de Kid Pepe, Germano Augusto e João da Silva Gaspar. Na época a autoria foi contestada por Divino, que dizia ser ele, junto com seu falecido primo Cedar Silva, diretor da escola de samba Mocidade Louca, o autor da canção. Acontece que Divino estava no leito de um hospital, e não teve muito tempo para brigar pela paternidade, que acabou sendo um belo presente para a música brasileira.



Acertei no milhar

A invenção do improviso foi por mero acaso, segundo o próprio Moreira da Silva, responsável direto pela popularização do “breque”. De acordo com o que ficou na história, ele teria remendado com astuto falatório os versos de “Jogo proibido”, em 1937. E foi esse exímio talento que convenceu o radialista César Ladeira a oferecer-lhe seguinte valor para cantar na Mayrink Veiga, ao que ele respondeu: “Ora, César, não vês que eu sou o tal?!”. Como na canção de Wilson Batista e Geraldo Pereira de 1940 ele acertou no milhar e ingressou de vez nas paradas de sucesso. Só que a astronômica quantia não passou de um sonho.



Amigo Urso

Moreira da Silva viaja até o pólo Norte para cobrar de certo amigo Urso que não lhe dê o calote. O samba pitoresco de Henrique Gonçalvez foi mais um êxito da carreira de Moreira que enfim deslanchava. Após um começo trôpego como cantor de umbandas e serestas ele encontrou seu verdadeiro terreno. E a década de 40 seria fértil em acertos musicais, especialmente em 1941.

Esta noite eu tive um sonho

As viagens e os sonhos de Moreira da Silva estavam expostas em suas músicas. Em tom de galhofa ele almeja partida para a Alemanha no samba “Esta noite eu tive um sonho”, em parceria com Wilson Batista de 1941. E até citação em alemão cabia na bagunça bem arrumada de Morengueira.



Na subida do morro

Trocar músicas na década de 50 era algo comum, segundo o próprio Moreira da Silva. Era essa relação que ele tinha com Geraldo Pereira. Um colocava o dedo numa autoria daqui, outro dali, e assim estabeleceu-se a parceria. Uma delas foi “Na subida do morro”, samba que conta com a graça maliciosa de Moreira da Silva, as intempéries de um triângulo amoroso que se transforma em crime passional. A canção politicamente incorreta foi um dos maiores sucessos de sua carreira, lançada em 1952.

Olha o Padilha

No samba “Olha o Padilha”, Moreira da Silva brinca com a fama nada boa de um certo delegado que dizem ter realmente existido. A música foi composta em 1952 ao lado de Ferreira Gomes e Bruno Gomes, e aborda como de costume as asperezas vividas no cotidiano do morro, sempre com muito bom humor.



Cidade Lagoa

“Cidade Lagoa” flagra o povo do Rio de Janeiro em apuros. Tudo porque a cidade foi de novo acometida por uma enxurrada. Os versos irreverentes de Cícero Nunes e Sebastião Fonseca debocham da situação repetida e apresentam novas soluções: comprar lancha, canoa ou ser girafa! Gravada por Moreira da Silva em 1959 e regravada por Jards Macalé em 1998, a música retrata uma realidade inalterada.

O Rei do Gatilho

Inspirado nos filmes de faroeste americano, Miguel Gustavo criou uma épica epopéia para seu personagem. Moreira da Silva vestiu a estampa de Kid Morengueira e saiu atrás de justiça. Com direito a um amigo Índio, cavalo, mocinha temerosa e citação de Hitchcock, a história bateu recorde de bilheteria na discografia do malandro herói, que ainda por cima terminava com a viúva do bandido que matou: “que até hoje ninguém sabe quem morreu, eu garanto que foi ele, ele garante que fui eu...”. Ou não! Tudo isso em 1962.



Morengueira contra 007

Miguel Gustavo teve como base inserir diversas personalidades em sambas feitos sob medida para Moreira da Silva cantar. No contexto das histórias de aventura, o humor era o grande trunfo. Essa fórmula esteve inclusive presente na música “Super-heróis”, de Raul Seixas e Paulo Coelho. A exemplo das bem sucedidas sequências cinematográficas, o herói Kid Morengueira cumpria sua missão ao final, fosse contra 007 ou qualquer outro. Mais uma vez em 1968 ele não se fez de rogado. E assim foi até o fim da vida, aos 98 anos, disposto como nunca a uma boa malandragem.

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